União Brasil faz pressão conjunta e provoca atritos com Lula, Tarcísio e Nunes
Terceiro maior partido da Câmara dos Deputados, fora o PL e a federação do PT, a União Brasil aumentou ao mesmo tempo a pressão em três esferas da federação com o objetivo de ampliar seu espaço nos governos Lula (PT), Tarcísio de Freitas (Republicanos) e Ricardo Nunes (MDB).
Nas últimas semanas, a negociação de cargos em troca do apoio em votações no Legislativo —o toma lá, dá cá típico do partido do centrão— gerou atritos da legenda com o presidente, o governador de São Paulo e o prefeito da capital paulista.
Líderes da União Brasil, porém, dizem que os episódios já foram contornados.
No plano nacional, a União Brasil preservou seu espaço na Esplanada dos Ministérios com a posse do deputado federal Celso Sabino (PA) na pasta do Turismo –o partido domina outros dois ministérios, das Comunicações e Integração.
Lula deve entregar ainda a Funasa (Fundação Nacional de Saúde) à União Brasil, que também pleiteia os Correios.
Ainda assim, o partido se classifica como independente em relação ao governo Lula, sem a obrigação de entregar votos favoráveis, a não ser em projetos com os quais concorde.
“A posição de independência do partido em nível nacional está preservada a despeito de qualquer mudança ministerial”, diz ACM Neto, secretário-geral da legenda.
Nos bastidores, membros da sigla dizem que a ascensão de Sabino, ligado ao presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), deve ajudar a ampliar a base do petista, mas não pacifica a relação por completo. Segundo eles, falta diálogo e identidade programática com o governo federal.
Em todo o país, o partido é fragmentado, mas a maior parte da bancada é de direita. Cerca de metade dos 59 deputados é alinhada ao governo Lula.
Em São Paulo, a União Brasil, que concorreu com Rodrigo Garcia (PSDB) e perdeu a disputa, apoiou Tarcísio no segundo turno em troca de fazer parte da administração. Na Assembleia Legislativa, também declaram-se independentes e chegaram a contribuir para uma derrota do bolsonarista no mês passado.
Já na capital, o partido faz parte da base de Nunes, mas ameaça ter um candidato à Prefeitura de São Paulo, o deputado federal Kim Kataguiri (SP), em vez de apoiar a reeleição do prefeito.
A bancada federal quer impulsionar a candidatura de Kataguiri e testar sua viabilidade, mas em São Paulo, seja na capital ou no estado, o partido é dominado por Milton Leite, presidente da Câmara Municipal. De acordo com ele, a maior parte da legenda prefere apoiar Nunes.
Embora Leite esteja fechado com Nunes e tenha uma série de cargos na administração, a direção nacional da União Brasil, composta pelo presidente Luciano Bivar, pelo primeiro vice Antonio de Rueda e por ACM Neto, deve ter a palavra final na posição do partido nas grandes cidades em 2024.
A rebelião da União Brasil contra Tarcísio ficou evidente na votação em junho de um projeto de lei do governo para viabilizar um empréstimo para financiar o trem intercidades. O líder do partido na Alesp é o deputado Milton Leite Filho.
Na primeira tentativa de votação, Tarcísio conseguiu apenas 46 dos 48 votos necessários. Dos sete deputados da União Brasil, cinco declararam obstrução, um estava licenciado e só o vice-líder do governo Guto Zacarias votou a favor. Houve baixas ainda entre tucanos e bolsonaristas, além da oposição de esquerda.
No dia seguinte, a União Brasil deu três votos favoráveis, mas Milton Leite Filho seguiu em obstrução. O projeto foi aprovado com 70 votos.
Segundo integrantes do partido, Milton Leite estava cobrando de Tarcísio a entrega da secretária de Habitação e a CDHU (Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado de São Paulo), algo que o vereador nega.
Na gestão tucana, o partido dominava secretarias de grande orçamento, como a de Logísticas e Transportes.
Tarcísio, porém, resiste a lotear seu governo e, por isso, é cobrado não apenas pela União Brasil, mas pelo Republicanos e pelos bolsonaristas –só o PSD do secretário de Governo, Gilberto Kassab, teve certo sucesso em emplacar aliados.
De forma reservada, dirigentes da União Brasil classificam Tarcísio como soberbo por, na visão deles, prescindir da composição política e querer governar sozinho. Eles dizem que o governador não cumpriu o combinado de aceitar indicações técnicas do partido para comandar secretarias.
Milton Leite afirmou à Folha que o entrevero com o governo estadual não teve a ver com cargos e nem com Tarcísio, mas com Kassab. O vereador disse que a prefeita de Barretos, Paula Lemos, estava sendo pressionada a migrar para o PSD em troca de receber verbas estaduais.
“O problema grave que houve foi em relação à prefeita, mas Tarcísio não sabia. Isso já foi ajustado, houve um desencontro de informação”, afirma Leite. Ele diz, porém, que a bancada estadual da União Brasil poderia ser mais contemplada, embora os pleitos estejam “andando”.
Kassab diz que a prefeita se filiou ao PSD, mas “não houve nenhuma pressão”. Ele afirma desconhecer estresse entre a União Brasil e Tarcísio e declarou mantar “a melhor relação possível” com integrantes da legenda.
Líderes do partido dizem que a relação com Tarcísio tende a melhorar, já que o governador sinalizou que deve entregar alguns cargos à legenda e afirmou querer manter a União Brasil próxima. A direção da sigla defende alinhamento a Tarcísio, mesmo com os limites que ele impôs a Leite.
Na capital, a relação entre Nunes e a União Brasil é consolidada, segundo membros do partido, mas também há disputa por cargos. Milton Leite queria que o filho fosse indicado conselheiro do TCM (Tribunal de Contas do Município), mas o prefeito escolheu seu ex-secretário de Fazenda Ricardo Torres.
Como revelou a coluna Painel, da Folha, Torres contemplou Leite na primeira indicação que fez ao seu gabinete. Ele nomeou Gislaine Hereda Pinheiro, namorada do deputado Milton Leite Filho para o cargo de assessora.
O desentendimento em relação ao TCM se soma aos outros pontos de tensão entre a legenda e Nunes, como a candidatura de Kataguiri e o pleito pela vaga de vice na chapa do prefeito. Outros partidos aliados como PL, Republicanos e PSDB querem o posto.
“Tem histórias que não são verdade, não houve estranhamento nenhum [com Nunes]. Está tudo ótimo”, diz Leite.
Dirigentes do partido negam que a legenda se mova apenas pela sede de cargos e atribuem esse comportamento mais à bancada de deputados. Para superar a condição de negociadora e coadjuvante de diferentes governos, a União Brasil quer crescer no Executivo —em 2024, o partido deve ter candidatos em ao menos 14 capitais.
Foto: Ricardo Stuckert/Divulgação/Arquivo