A Polícia Federal investiga se Mauro Cid, que foi ajudante de ordens do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), tentou vender um relógio por quase R$ 300 mil recebido como presente em viagem oficial.

A suspeita surgiu a partir de uma troca de email de Cid com Maria Farani, que trabalhou na assessoria do Gabinete Adjunto de Informações presidencial até janeiro de 2023, sobre uma possível negociação do aparelho da marca de luxo Rolex.

Nas mensagens, ela pergunta por quanto o então ajudante de ordens de Bolsonaro pensava em receber pelo relógio e questiona sobre o certificado de garantia original do item. Ele, por sua vez, diz que pretendia vender a peça por US$ 60 mil (cerca de R$ R$ 290 mil).

Os documentos com a troca de emails foram enviados à CPI do 8 de Janeiro. Trata-se de mais um episódio negativo para Bolsonaro que tem Mauro Cid, que é tenente-coronel do Exército, como figura central.

Cid era uma das pessoas mais próximas do ex-presidente durante seu mandato à frente do Executivo e atualmente está preso por ordem do ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), sob suspeita de ter atuado para inserir no sistema do Ministério da Saúde dados falsos de vacinação.

Agora, ele também é investigado pelo caso do Rolex.

O ex-presidente Jair Bolsonaro recebeu um Rolex em 30 de outubro de 2019, durante almoço oferecido pela monarquia da Arábia Saudita à comitiva brasileira.

Em 11 de novembro daquele ano, o Rolex foi registrado no sistema do Gabinete Adjunto de Documentação Histórica do gabinete da Presidência da República.

A liberação do relógio no sistema ocorreu no dia 6 de junho de 2022. A troca de emails de Cid com Farani foi feita nesta mesma data, no meio do ano passado.

Ao jornal O Globo, a ex-assessora da Presidência afirmou que Cid pediu sua ajuda porque ela é fluente em inglês —idioma usado nas mensagens trocadas entre os dois.

“Por eu falar inglês, ele pediu que eu mandasse esses emails e, quando recebi as respostas, encaminhei para ele”, afirmou Farani.

“Ali, eu fazia secretariado-executivo, então, eu auxiliava todas as autoridades. Se pediam para mim ou para outra pessoa, não tinha como falar ‘eu não vou fazer’”, disse.

E prosseguiu: “Eu apenas intermediei, mas eu não sei com quem ele tratou. Eu repassei para ele os emails e foi só essa minha participação, eu não sei qual foi o desfecho disso. Não passou mais por mim”.

Nas mensagens em posse da CPI de 8 de Janeiro, Cid diz que o aparelho nunca foi utilizado, mas que não tem certificação de originalidade porque tratou-se de um presente recebido em “viagem oficial de negócios”.

“Nós não temos o certificado para o relógio, uma vez que ele foi um presente recebido numa viagem oficial de negócios. O que temos é o selo verde de certificado superlativo que vem junto com o relógio. Além disso, posso garantir que o relógio nunca foi usado. Pretendo obter com a peça um valor de cerca de US$ 60 mil”, diz Cid na mensagem.

A troca de emails foi revelada pelo O Globo. A Folha teve acesso às mensagens.

Farani afirma no e-mail que o mercado de Rolex usados estaria “em baixa”. “O mercado para Rolex usados está em baixa, especialmente para relógios cravejados de platina e diamante (já que o valor é tão alto). Só queria me certificar de que estamos na mesma linha antes de fazermos muita pesquisa”.

Esta não é a primeira vez que a CPI se depara com Cid. Ele inclusive já prestou depoimento à comissão em 11 de julho. No entanto, se recusou a responder as perguntas e apenas leu uma texto no início da sessão em que relativizou suas atribuições no governo anterior e comparou seu papel a de um secretário.

Além das questões da vacinação e, agora, do relógio, Cid deve enfrentar outros percalços judiciais nos próximos meses.

O Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras), órgão de combate à lavagem de dinheiro, apontou “movimentações atípicas” e “incompatíveis”, além de “indícios de lavagem de dinheiro”, nas contas bancárias do tenente-coronel.

A defesa de Cid alega que todas as movimentações foram declaradas e têm origem justificada no patrimônio familiar do militar.

Cid também é alvo de investigação da PF que apura se Bolsonaro teria atuado para ficar com joias e outros artigos de luxo presenteadas pela Arábia Saudita e apreendidas na alfândega do aeroporto de Guarulhos.

Documentos e relatos confirmam que, no final de dezembro de 2022, houve uma mobilização na Presidência na tentativa de liberação do material, incluindo envio de um integrante da ajudância de ordens, chefiada por Cid, ao aeroporto de Guarulhos em busca dos presentes.

Cid teria ainda preparado um ofício encaminhado para a Receita solicitando a liberação das joias.

Foto: Geraldo Magela/Agência Senado

 

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