Na véspera da operação da Polícia Federal que apontou para um suposto esquema de venda de joias e itens de alto valor recebidos por Jair Bolsonaro (PL) durante agendas oficiais, a ex-primeira dama Michelle Bolsonaro (PL) disse que tudo o que foi feito durante a trajetória política do marido foi “pela misericórdia de Deus” e não pelo poder, reforçando o discurso direcionado para o eleitorado conservador e evangélico.

Michelle também sugeriu uma “segunda temporada” do clã Bolsonaro no poder. “Exaltamos o nome do nosso Deus e foi Ele que nos ajudou. Se não fosse Ele, nós não estaríamos aqui. Ele escolheu Jair Messias Bolsonaro para uma missão e Ele o capacitou, então tudo que nós fizemos foi pela misericórdia de Deus. Não foi por poder. Quem nos conhece sabe disso”, disse a ex-primeira-dama durante uma entrevista ao podcast Pod Atualizar na quinta-feira, 10.

“O legado de Jair Messias Bolsonaro foi ter resgatado o patriotismo, foi ter plantado uma semente no coração das crianças e isso com certeza vai frutificar. Foram resgatados os valores, o amor à nação”, disse. Ela ainda afirmou que o próprio legado como primeira-dama foi o de ter dado visibilidade a pessoas “invisíveis” e trabalhar pelas “mamães atípicas”.

Durante a entrevista, Michelle afirmou que Deus também ama as pessoas de esquerda. “Mas olha só, essas pessoas de esquerda, Deus também ama cada um deles porque a criação de Deus”, disse.

Operação Lucas 12:2

Nesta sexta-feira, 11, a Polícia Federal realizou buscas e apreensões em quatro endereços em Brasília, São Paulo e Niterói, tendo como alvos o advogado criminalista Frederick Wassef, o general Lourena Cid (pai de Mauro Cid) e Osmar Crivelatti, outro ex-ajudante de ordens de Bolsonaro. A corporação investiga um esquema de venda de joias, esculturas e outros bens de alto valor que o ex-presidente ganhou durante agendas oficiais.

Para a Polícia Federal, Bolsonaro está diretamente vinculado ao esquema, e teria recebido valores provenientes dessas transações em dinheiro vivo. Trocas de mensagens interceptadas pela PF mostram Mauro Cid e o pai combinando de levar um coqueiro de ouro para avaliação. A imagem do general Lourena Cid – que é amigo pessoal de Bolsonaro – aparece refletida na embalagem da escultura.

Em novembro de 2022, Bolsonaro ganhou o item de presente durante uma agenda oficial nos Emirados Árabes. Outro objeto que faz parte das investigações é um relógio da marca Rolex, cravejado de diamantes e platina. Mauro Cid tentou vendê-lo e, depois, Wassef recomprou o objeto para devolvê-lo ao Tribunal de Contas da União (TCU).

O nome da operação é uma referência a um trecho bíblico que diz “nada há encoberto que não haja de ser descoberto, nem oculto que não haja de ser sabido”.

Envolvimento da ex-primeira-dama

Michelle não é investigada no caso que deu origem à operação da PF desta sexta. No entanto, ela é mencionada em uma das trocas de mensagens entre os ex-ajudantes de ordens de Jair Bolsonaro.

O ex-assessor especial Marcelo Câmara fala para Mauro Cid que alguns dos objetos de alto valor que seriam vendidos teriam desaparecido, atribuindo a Michelle a responsabilidade sobre um deles. “Porque já sumiu um que foi com a dona Michelle”, disse Câmara. As mensagens não esclarecem de qual objeto se trata.

Outro tom

No dia da operação, Michelle almoçou em um restaurante em Brasília acompanhada do seu amigo pessoal e maquiador, Agustín Fernandez, quando foi cobrada por uma mulher sobre o destino das joias que teriam sido supostamente desviadas por Bolsonaro e aliados. O tom da reação foi oposto ao da entrevista concedida ao podcast Pod Atualizar na quinta-feira.

A ex-primeira-dama se aproximou da mulher que lhe questionou em público e disse “tão mal informada que saberia onde estão as joias”. Fernandez ainda teria jogado gelo na mulher, a chamado de “vagabunda” e xingado com outras palavras de baixo calão.

Em uma nota, a assessoria de Michelle disse que ela foi importunada com provocações e insultos durante um almoço com amigas, quando tirava fotos com um casal. As perguntas sobre as joias teriam sido uma “tentativa de preparar uma cilada midiática”, segundo a nota.

Futuro na política

Michelle ganhou destaque e protagonismo durante as eleições de 2022 na atuação como cabo eleitoral do ex-presidente, especialmente em comícios evangélicos. O desempenho da ex-primeira-dama chamou a atenção de lideranças partidárias do PL, que pensam nela como uma possível candidata à Presidência em 2026.

Após a derrota do ex-presidente nas urnas, Michelle assumiu a presidência do PL Mulher, núcleo da sigla focado em incentivar candidaturas femininas e discutir políticas favoráveis às mulheres. Com um salário de R$ 33 mil, a ex-primeira-dama passou a realizar viagens em todo o País pelo núcleo feminino. Foi então que a notoriedade da ex-primeira-dama foi se expandindo. Bolsonaro, em todos os encontros, buscou uma forma de estar presente nos discursos da esposa, seja virtualmente ou presencial.

Após Bolsonaro ficar inelegível por oito anos por decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Michelle passou a ser uma opção de sucessão para o legado bolsonarista por ter uma linha direta com os eleitores evangélicos e com mulheres. Diante da situação, a ex-primeira-dama deixou claro que vai assumir a missão política que lhe for colocada. “Estou às suas ordens, meu capitão”, disse na época em uma rede social.

Do outro lado, Bolsonaro afirmou que a Michelle ainda é inexperiente para a política. “Ela (Michelle) não tem experiência para enfrentar o dia a dia de uma política bastante violenta com um sistema bastante ativo no Brasil”, disse o ex-presidente.

 

Foto: Marcello Casal Jr./Agência Brasil/Arquivo

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